Os melhores de 2013, segundo o JOGO DE CENA

Foto: Claudinei Nakasone

Como de hábito, quando o ano acaba, costumamos avaliar o que foi realizado ao longo dos meses vividos. Na imprensa, não é diferente; pipocam listas de “os melhores” disso e daquilo e retrospectivas diversas. O blog Jogo de Cena estreou em 2013 e, mesmo com as mudanças de plataforma e endereço e com meus silêncios esporádicos, consolidou-se como mais um espaço de reflexão sobre o teatro e seus pontos de diálogo com o mundo. Ainda há muito o que aprimorar, reconheço, mas afirmo com satisfação que aprendi muito com esse exercício crítico e apreciei a possibilidade de interlocução com criadores e leitores em geral.

Assisti a mais de 160 espetáculos teatrais – e devo dizer que alguns me arrebataram; outros me surpreenderam positivamente com suas propostas ousadas e/ou autorais; muitos me pareceram interessantes e tantos, apenas corretos; e obviamente houve aqueles que me frustraram ou aborreceram (em um ou outro caso, as duas situações ao mesmo tempo). Não acho que o teatro tenha morrido; talvez certas formas de fazer teatro atualmente tenham se tornado obsoletas ou esvaziadas. Também o público vem adquirindo outras exigências e expectativas em relação ao que vê no palco, na arena ou nas ruas (reflexo natural do caminhar da sociedade… ). Aliás, não creio que exista apenas um público, como uma entidade homogênea e impassível, que paira acima do bem e do mal; existem públicos – dos mais adestrados aos mais contestadores. Por isso, na minha opinião, o teatro continuará vivo enquanto houver gente apaixonada e comprometida, que se delicia em estar em cena e se inspira nos clássicos e nos mestres tanto quanto desobedece certas regras e convenções para ir adiante. O teatro continuará vivo enquanto houver diálogo, um diálogo pulsante e rico, entre os artistas e os espectadores, entre a criação coletiva e o mundo.

Divagações à parte, apresento a seguir uma lista bastante pessoal com os destaques de 2013. A ordem é aleatória; divido entre brasileiras e estrangeiras e não incluo reestreias (mesmo que eu tenha visto a peça apenas em segunda temporada):

_ Nacionais:

Érica Montanheiro e Kátia Daher em "A Canção de Bernadete", de Os Fofos Encenam, que integrou o repertório da programação especial Circo Teatro Arethuzza. (Foto: Lígia Jardim)

Érica Montanheiro e Kátia Daher em “A Canção de Bernadete”, de Os Fofos Encenam, que integrou o repertório da programação especial Circo Teatro Arethuzza. (Foto: Lígia Jardim)

 

Medeia Vozes, com a Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz, do Rio Grande do Sul (Galpão do Vento Forte);

Circo Negro, com a curitibana CiaSenhas (Teatro da Aliança Francesa);

Cais – ou da Indiferença das Embarcações, com a Velha Companhia (Instituto Capobianco);

Cachorros não Sabem Blefar, com os mineiros da Cia. 5 Cabeças (CIT-Ecum);

A Canção de Bernadete, de Os Fofos Encenam (Espaço dos Fofos);

Nossa Classe, com os alunos da oficina dirigida por Zé Henrique de Paula (Espaço do Núcleo Experimental);

São Manuel Bueno, Mártir, do Grupo Sobrevento (Espaço Sobrevento).

_ Internacionais:

Os atores do Odin Teatret, dirigido por Eugenio Barba, em "A Vida Crônica". (Foto: Rina Skeel)

Os atores do Odin Teatret, dirigido por Eugenio Barba, em “A Vida Crônica”. (Foto: Rina Skeel)

 

Mundo Maravilha e Se uma Janela se Abrisse, da companhia portuguesa Mundo Perfeito (Sesc Belenzinho);

Translunar Paradise, com os ingleses da Theatre Ad Infinitum (CCBB);

Ukchuk-ga (Mãe Coragem), dos coreanos Pansori Project ZA (Sesc Vila Mariana);

66 Minutes in Damascus, do grupo dirigido pelo libanês Lucien Bourjeily (Tusp);

Vida Crônica, de Eugenio Barba e Odin Teatret (Sesc Belenzinho).

Mi Vida Después, do grupo dirigido pela argentina Lola Arias (Tusp);

Damned Be the Traitor of His Homeland, dos atores do esloveno Mladinsko Theatre dirigidos pelo croata Oliver Frilijc (Tusp).

_ Menção especial:

André Capuano em "Vigília", espetáculo de 12 horas de duração, que contava também com os atores Carlos Canhameiro e Daniel Gonzalez.

André Capuano em “Vigília”, espetáculo de 12 horas de duração, que contava também com os atores Carlos Canhameiro e Daniel Gonzalez.

 

Merecem também meu registro, pela originalidade da proposta e/ou da linguagem, pela audácia ou pela provocação positiva (isso não significa que eu não tenha ressalvas em relação a alguns deles):

White Rabbit, Red Rabbit, de Nassim Soleimanpour (Sesc Vila Mariana);

Marias da Luz, com As Graças dirigidas por André Carreira (Parque da Luz);

Homem não Entra, da Cia. Pessoal do Faroeste (Sede Luz do Faroeste);

Estrada do Sul, do Grupo XIX de Teatro (Vila Maria Zélia);

Vigília, projeto do dramaturgo e diretor Cássio Pires (Oficina Oswald de Andrade);

Projeto Puzzle, de Felipe Hirsch (Sesc Pinheiros).

O Duelo, da mundana companhia (CCSP).

_ Intérpretes:

Cácia Goulart  em cena do monólogo "A Morte de Ivan Ilitch". (Foto: Cacá Bernardes).

Cácia Goulart em cena do monólogo “A Morte de Ivan Ilitch”. (Foto: Cacá Bernardes).

Nos monólogos, destacaram-se a sempre excepcional Cácia Goulart, pela peça A Morte de Ivan Ilitch (Espaço Redimunho), e o ótimo Cássio Scapin, por Eu Não Dava Praquilo (CCBB).

Vi o talentoso ator André Capuano em cena em quatro oportunidades: Sonata a Kreutzer (Sesc Pinheiros); Gota d’Água (reestreia; CIT-Ecum); Barafonda (reestreia; espetáculo pelas ruas da Barra Funda) e Vigília. Em todas as peças, ele esteve ótimo.

Bruno Rudolf, da Cia. Solas de Vento, se destacou em Memória Roubada (CCSP) tanto na interpretação de seus personagens (ele fazia, inclusive, um adorável cachorrinho) quanto, e principalmente, como ator-manipulador da boneca que representava  Aparecida, uma das protagonistas.

O talentoso Bruno Rudolf em ação durante "Memória Roubada", um espetáculo que reuniu diversas linguagens. (Foto: Paulo Barbuto)

O talentoso Bruno Rudolf em ação durante “Memória Roubada”, um espetáculo que reuniu diversas linguagens. (Foto: Paulo Barbuto)

_ E mais:

Por fim, mais alguns aplausos:

* À proposta da Cia. Sinhá Zózima de usar o espaço do ônibus como palco de seus espetáculos. A companhia existe desde 2007, mas eu só a conheci em 2013 com a peça Dentro É Lugar Longe (ônibus desde o Terminal Parque Dom Pedro).

* À abertura do CIT-Ecum em São Paulo, espaço que dá a oportunidade de o público rever espetáculos que já estiveram em temporada na cidade, além de trazer peças de grupos importantes de outros estados. Parabéns ao Ruy, à Erica, ao Guilherme & demais colaboradores.

* À realização da I Bienal Internacional de Teatro da USP, com o tema “Realidades Incendiárias”, que trouxe ao Brasil peças e estéticas diferenciadas vindas de países com realidades conflituosas. Parabéns à Dedé, Maria, Ferdinando, René, Elcio & toda equipe envolvida.

* À dramaturga Michelle Ferreira, que teve três textos seus montados  em 2013: Os adultos estão na sala (direção dela mesma ; Sesc Pinheiros), Tem Alguém que Nos Odeia (direção de José Roberto Jardim; Teatro Augusta) e As Olívias em Riso Nervoso (direção de Hugo Possolo; Teatro Viradalata). Não vi o último, que imagino ter um tom bem diferente, dos demais mas gostei dos dois primeiros – em especial, do segundo, cuja montagem me agradou bastante. Acho Michelle bastante perspicaz e bem-sucedida em sua abordagem das relações humanas, tocando em temas como a violência, a surdez social e os impasses urbanos. Seus textos combinam uma sensibilidade não-afetada, humor sutil e um toque de crueldade.