O gesto essencial: pura poesia (3)

TRANSLUNAR PARADISE, Theatre Ad Infinitum

Cena do espetáculo apresentado pelo grupo inglês Theatre Ad Infinitum (crédito: Alex Brenner)

E num desses sábados repletos de garoa e suspiros, fui com um amigo assistir ao belo espetáculo da trupe inglesa Theatre Ad Infinitum, o exemplo perfeito para essa reflexão sobre o “gesto essencial”. No palco, apenas dois atores, George Mann e Deborah Pugh, e a instrumentista Kim Heron e seu acordeão, além de alguns objetos cênicos. Trata-se de uma peça sem texto, no sentido literal do termo: nada de discurso, diálogos, palavras e mais palavras. Existe, sim, uma narrativa que orienta a partitura corporal dos atores (e se orienta por ela) e estabelece um jogo entre os personagens, mas ela dispensa a fala. O corpo diz tudo. Há silêncio e há música em exata medida. E há tanta poesia: um homem, já idoso, perde a companheira de toda a vida. Não se conforma com sua ausência e, teimosamente, se mantém preso às lembranças e à saudade. A mulher, num plano onírico, tenta ajudar o marido nesse processo de desapego.  E assim, pouco a pouco, o homem reaprende a ressignificar seu cotidiano, aceitando a morte da esposa.

A peça teve sua estreia no Festival de Edimburgo de 2011, na Escócia, e ficou em turnê na Inglaterra ao longo de 2012. É interessante ver como o trio inglês, munido de uns poucos elementos – como as máscaras, que indicam os personagens já velhos –, consegue transitar em tempos (passado e presente) e planos (a realidade, a memória e o sonho) distintos usando apenas a linguagem do corpo e a bela trilha sonora. A direção e o roteiro são de George Mann. A companhia, que conta ainda com o israelense Nir Paldi, segue o método de teatro físico proposto pelo francês Jacques Lecoq (1931-1999), baseado na dinâmica do movimento.

Translunar Paradise me deixou pensando na dificuldade que todos temos, em maior ou menor grau, em dizer adeus. Aceitar as rupturas – inevitáveis e inerentes à vida – e seguir adiante. Muitas vezes, por insegurança e medo, nos agarramos às recordações de uma pessoa que se foi, de um amor que passou ou de uma situação que costumávamos viver; abraçamos o passado e nos esquecemos de olhar para as novidades que a vida presente nos oferece. A cena final do espetáculo não é só bonita, é também mágica, quase catártica: de certo modo, saímos todos emocionalmente transformados. E mais leves.

Deborah Pugh e George Mann em "Translunar Paradise", linda peça sem diálogos, só com gestos e movimentos precisos. (Crédito: Alex Brenner)

Até 7/4, qua. a sex. 20h; sáb. 17h30 e 20h; e dom. 16h30 e 19h. CCBB: R. Álvares  Penteado, 112, Metrô Sé ou Metrô São Bento, tel. 3113-3651. Gênero: drama. Duração: 70 min. Classificação: 14 anos. Ingressos: R$ 6. Crédito: M/V. Débito: M/R/V. Onde comprar: no CCBB (ter. a dom. 9h/20h); com taxa pelo tel. 4003-1212 ou pelo site ingressorapido.com.br.